Pais e filhos

Gerações no Surf

Alguns deles saíram Brasil afora à procura das melhores ondas. Outros descobriram o surfe no litoral gaúcho há décadas e nunca o deixaram de lado. Em comum, esses quarentões e cinquentões têm o amor pelo esporte e um ingrediente extra para praticá-lo com mais vontade: a parceria dos filhos.

O primeiro contato de Rafael Dall’Agnol com a prancha foi em 1982, aos nove anos, ao surfar com um amigo. O ânimo para continuar pegando ondas era grande e, em 1983, o porto-alegrense já estava na então tranquila Garopaba deslizando no mar. Aos 41 anos, Dalanha – como é chamado – teve como principal feito a participação no Circuito Renner, em meados da década de 1980. Na competição, ele foi pódio em todas as etapas e conquistou um troféu que hoje mostra à filha, Pietra.

No passaporte do administrador, que trabalha no setor imobiliário, há viagens para Havaí, Indonésia, Costa Rica, México e Califórnia, além da Austrália, onde morou por um ano. Dalanha participou de campeonatos e chegou a viver do surfe, com patrocínio. Agora, ele se mostra empolgado quando fala de Pietra.

– Ela é um peixinho. Foi me vendo no mar e começou sozinha – orgulha-se.

Pietra Dall’Agnol tem sete anos de idade e um de surfe. Ao lado da prancha, a menina fica pequena mas não liga: sempre que pode, está na praia.

– O melhor do surfe é a amizade, o contato, a união da turma – resume Dalanha, que, na Capital, faz stand up paddle (SUP) e petrosurfe (surfe em ondas criadas pela lancha, em água doce).

Outra dupla de pai e filha que surfam juntos é formada por Marcelo Lemos, 41 anos, e Bruna Lemos, 12. Natural de Santos e morador do Rio Grande do Sul desde 1978, Marcelo teve seu início no esporte aos 14 anos – pegava onda aqui no Estado e, nas férias, na terra natal.

Bruna também começou cedo, mas não por influência dele. Depois de assistir ao filme Soul Surfer em 2013, a guria resolveu se arriscar, embora a produção contasse a história de uma atleta que perdeu o braço em um ataque de tubarão. A partir de então, a dupla passou a entrar na água junta. Até no inverno, os dois deixam Porto Alegre e rumam para a casa no Remanso, em Xangri-lá. De lá, seguem para aproveitar as ondas de Atlântida.

A exemplo de Bruna, Tiago Gehlen Zorzanello, 15 anos, não teve uma relação de amor à primeira vista com o surfe. Aos oito anos, o estudante ganhou uma prancha de aniversário, mas não ligou. Só dois anos depois ele daria importância ao presente, tornando-se parceiro do pai, o representante comercial Marco Antonio Zorzanello, 52 anos.

– No inverno, ele (pai) não tinha companheiro. Aí, comecei a vir com ele a Tramandaí – diz Tiago.

Marco Antonio surfa desde 1976. Na época, o equipamento era uma prancha de madeirite que já fora usada como banco. Depois, ele passou a dividir com a gurizada da vizinhança uma prancha de poliuretano. Ao mudar-se para Florianópolis, Marco Antonio conquistou a própria prancha.

– Surfo pela amizade. Nunca parei – afirma o representante comercial.

O resgate do surfe gaúcho

Os personagens desta reportagem conversaram com Zero Hora durante os trials para a terceira edição do Madeirite Trópico, evento que tem por objetivo resgatar a história do surfe gaúcho. Os organizadores preferem não chamá-lo de campeonato, por considerarem que a disputa está em segundo plano. O que vale mesmo, garantem, é o contato entre as diferentes gerações de atletas.

– No primeiro Madeirite, eram reencontros emocionados. Amigos antigos se reencontrando e mostrando suas famílias. Por um final de semana, essas pessoas voltam a ter pé na areia, a usar bermuda – explica Giovanni Mancuso, um dos organizadores do evento, que será realizado em várias praias do litoral gaúcho.

Para Gustavo Schifino, diretor de expansão da Trópico Surf Shop, trata-se do “maior encontro de gerações de toda história do surfe brasileiro e o resgate das raízes do esporte”.

O Madeirite é dividido em nove categorias: Sementes (até nove anos), Sementes (até 12 anos), Presidentes da Federação Gaúcha de Surf, Campeões da Taça Trópico, Pais e Filhos, Anos 60, Anos 70, Anos 80 e Flowers. Depois das etapas locais em sete praias – organizadas pelas associações – e da votação pelo site (www.madeiritetropico.com.br), as finais ocorrem em 29 e 30 de março, em Torres.


Rafael Dall'Agnol e sua filha de 07 anos
Foto: Félix Zucco / Agência RBS